Como ovo

quinta-feira, 17 de maio de 2012
(um suco e uma omelete)

As vezes sinto-me como ovo. O ovo é forte, possui uma casca firme que lhe serve de proteção. Mas proteger do quê? De mim mesmo. Dos outros. De nada.

Até mesmo a dureza do ovo mais resistente não consegue impedir que todas as impurezas permaneçam do lado de fora do ovo. Silenciosamente a casca permite a entrada dos corpos estranhos. Não por escolha, afinal naturalmente a osmose da vida acontecerá, e então aquele ovo se adapta, muda. Algumas coisas enriquecem o sabor, outras o estraga. Algumas o fazem desidratar, e outras ainda o saturam de tal forma, fazendo a própria casca se desfazer.

Estes recipientes ovais são tão fortes por fora, porém tão frágeis por dentro. Seu conteúdo além de valioso (vida!) é muito frágil. Tenho medo de ter me agitado de mais, e por algum motivo ter virado um ovo mexido. Temo ter procurado por ser chocado com muita avidez, acabando por tornar-me choco.

Os ovos não vêm ao mundo para se preocuparem com o que suas cascas absorverão ou se defenderão. Eles existem apenas para permitir que a vida aconteça. Como posso me sentir um ovo, então? Não cabe a mim escolher o que será marcado em brasa, ou o que será rejeitado sem ponderação. Se não escolhemos o funcionamento de nossas defesas, para que temos casca?

Perguntei-me em momentos se os pensamentos realçam o meu sabor, ou se apenas me saturam, estufando-me. Acredito que dependendo da qualidade do pensamento, do tipo, da natureza dele, é que ira criar esta variação de efeito.

Não sei se chegarei ao ponto de estar tão saturado, que minha própria casca desfaria. E o que isso significaria?  Sem minha casca estaria eu livre, ou condenado para todo o sempre?

Eu, como ovo, me tornarei algo novo e cheio de vida, ou apenas me tornarei uma bela omelete na frigideira de alguém?

Sou ovo, mas de quê? De jacaré, cobra, pássaro, inseto, ornitorrinco, dinossauro? Eu tenho é medo. Medo de irromper a minha casca e ter que encarar o meu verdadeiro eu. E que Eu! (terrível Eu).

Mas por vezes sinto-me como homem. Sem cascas, sem medos, sem bicos, nem escamas. Sinto-me livre da obrigação de escolher o que ser. Eu, fruto do ventre, simplesmente sou que sou. Homem pensante, pensando que é ovo.

2 comentários:

{ Oissat } at: 18 de maio de 2012 às 13:24 disse...

Como todo ovo cheio de dúvidas. Um mesmo caminho, um nascer. E com este, novas dúvidas surgiram. Condenados? Só a morte para nos responder.

{ Unknown } at: 14 de junho de 2012 às 08:39 disse...
Este comentário foi removido pelo autor.

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