Porcos

terça-feira, 23 de agosto de 2011
(um conhaque com mel)

José era um homem extremamente feliz. Ele nasceu sem conhecer a luz do sol e assim foi por muito tempo.
Ele cresceu em meio a outros homens que como ele não viu muita mais do que as brancas paredes e as frias luzes de suas casas.
Mas eles não tinham muito do que reclamar, afinal os porcos eram bons  para com os homens. Sempre colocavam demasiada comida e a água era sempre fresca.
Sem família ou amigos José fazia apenas aquilo que lhe cabia fazer, comer. E foi assim que em poucos meses ficou gordo, inchado. Seu corpo era todo deformado e a comida produzia nele coisas estranhas. José não conseguia falar, as coisas a sua volta não faziam muito sentido e quanto mais ele comia mais vontade de comer dava.
Foi assim que ele passou toda sua curta vida, esperando o momento em que os porcos viriam buscá-lo como faziam com os demais.
Mas os porcos eram bons, eles cuidavam dos homens.  Todos eram vacinados, tratados e ganhavam banhos de água fria para manterem a pele limpa.
Os criadores de homens também se preocupavam com o ambiente e assim não haviam degraus ou qualquer dificuldade no recinto. Afinal eles não queriam que os homens trabalhassem seus músculos e endurecessem suas carnes. Os homens eram fracos e para não se esforçarem muito ficavam sempre próximos a suas comidas.
José não ficava sozinho nunca, sempre haviam alguns porcos para vigiarem e atender prontamente para caso algum homem se machuque em alguma briga. Os homens ficavam muito estressados entre si, o espaço pequeno aflorava o desespero de alguns.  Assim, alguns eram forçados a deixar o abrigo mais cedo e não se sabia ao certo qual fim os porcos os davam.
Assim, nosso amigo José preferia se comportar e fazer apenas o que um bom homem deveria.
O tão esperado dia chegou, os porcos vieram com seus trajes brancos e sorriso nos rostos. Os humildes olhos de homem de José brilhavam diante dos visitantes. As portas se abriram e todos os homens foram cuidadosamente guiados para a saída. Pela primeira vez a luz do sol tocou a pele do feliz José, que também pela primeira vez deixava seu cativeiro. Seus pequenos olhos negros tentava assimilar todas a informações que a estrada dos porcos poderia oferecer.
A viagem fora curta e novamente ele retornava ao um lugar de paredes brancas e luzes frias. Neste lugar o chão era frio e molhado e de súbito o medo tomou conta de José. Apesar de toda paz que o lugar passava algo novo estava no ar, era como se ele pudesse sentir que os porcos o fariam algo ruim. Mas era impossível voltar, a grande massa de homens era guiada junta e seus companheiros espremidos a ele impediam seu regresso.
Todos foram guiados a uma única fila. Os primeiros iam entrando por uma passagem coberta por um pano e aos poucos todos foram sumindo. O feliz José já não se sentia tão feliz, e seus humildes olhos negros miravam o caminho que o levaria ao fim. Em um breve momento o homem se perguntou: por que? Porém já era muito tarde, e os planos dos porcos para com os homens eram estes. Não haviam homens, olhos, cores, ou motivações que superassem seus desejos pela carne. O não mais feliz José faria através de sua morte várias famílias de porcos felizes. Era sua forçada contribuição. Aquele dia José e todos os seus semelhantes morreram no abate.


Ser humano não é ser porco
Muringa.

2 comentários:

{ Fábio CJ } at: 25 de agosto de 2011 às 16:03 disse...

O café estava delicioso. Por essa mudança de perspectiva, Arthur, vc conseguiu mostrar um pouco da vida de um animal criado para um abate. Ótimo o texto msm. mt bem feito. Viva o vegetarianismo

Filipe Azevedo at: 29 de agosto de 2011 às 08:41 disse...

Felizmente estou no topo da cadeia alimentar. E adoro bacon! :coolface:

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E aí o café estava bom?